Quando minha tia voltou de uma viagem à Europa, em 90, trouxe, entre muitas coisas, uma boneca para a minha prima. Não era uma boneca qualquer. Era daquelas que considerávamos chiques e as quais tínhamos, então, de tratar com todo o cuidado possível. Praticamente não era uma boneca de brincar, e sim, de enfeitar. Se não me engano, era feita de material que quebrava, talvez porcelana. Tinha o vestido de tecidos nobres para uma boneca, cheio de delicadezas e rendas. O rosto era bem feitinho, com traços finos, o que considerávamos exemplo de uma beleza europeia.
Não me lembro ao certo da sua cor de cabelo, nem da cor de seu vestido; talvez fosse amarelo. Mas não esqueço da caixa em que a boneca veio: mais ou menos do tamanho de uma caixa de sapatos, de papel duro e branca. Branca, branca, sem nada escrito, sem um número, uma palavra, um logotipo. Na minha experiência de criança, achei aquilo o máximo da sofisticação, se é que tal conceito já existia na minha cabeça. Era lindo. Uma boneca tão fina, dentro de uma caixa simplesmente branca. Nada daquelas caixas que eu estava acostumada a ver no Brasil, cheias de cores extravagantes, fontes das mais inusitadas, todas desejando chamar mais a atenção do que as outras para a sua marca.
Eu costumava usar essas caixas para guardar coisas no meu armário. Em uma guardava cartas, em outras guardava brinquedinhos, em outra guardava minha barbie com suas roupinhas. De repente me veio na cabeça uma linda imagem: e se todas aquelas caixas guardadas no meu armário fossem brancas? E fui além; imaginei o armário repleto apenas de caixas brancas, uma em cima da outra, todas do mesmo tamanho, se encaixando com perfeição. O que teria dentro delas era outra história, pois, afinal, quem observasse de fora não veria a imensa variedade de objetos que escondiam, as diversas cores, formatos, tamanhos, a forma caótica com que esses itens se ajeitavam; veria apenas uma cena homogênea, uma periodicidade branca.
Quis compartilhar as minhas ideias com minha prima:
"Às vezes você não acha que seria mais legal se todas as caixas fossem brancas, assim, desse tamanho?"
"Não" — ela respondeu.
A reposta espontânea e sincera de minha prima me surpreendeu. Então era só eu que pensava aquelas coisas. Comecei a me achar estranha. Realmente, porque alguém iria querer que todas as caixas fossem brancas se, afinal, poderiam existir tantas caixas bonitinhas por aí. Além do mais, por que ficar admirando uma caixa se o principal é o que vinha dentro dela? Será que era possível alguém admirar uma caixa branca, como eu? Minha prima provavelmente a ignorava, talvez, principalmente por ser branca e não trazer nenhum diferencial. Pouco tempo depois de ter voltado à sua cidade e ter colocado sua boneca na prateleira, deve ter jogado a caixa fora, sem dó.
Mesmo percebendo que ela não ligava para a caixa, não tive coragem de pedir. Afinal, uma caixa daquela não era suficiente; eu desejava muitas delas.
Ao perceber tudo isso, pensei que poderia ser como essas pessoas que eu imaginava não ligarem para caixas, nem para o fato de serem brancas, coloridas, escritas ou não. Mas eu já não era.
Não me lembro ao certo da sua cor de cabelo, nem da cor de seu vestido; talvez fosse amarelo. Mas não esqueço da caixa em que a boneca veio: mais ou menos do tamanho de uma caixa de sapatos, de papel duro e branca. Branca, branca, sem nada escrito, sem um número, uma palavra, um logotipo. Na minha experiência de criança, achei aquilo o máximo da sofisticação, se é que tal conceito já existia na minha cabeça. Era lindo. Uma boneca tão fina, dentro de uma caixa simplesmente branca. Nada daquelas caixas que eu estava acostumada a ver no Brasil, cheias de cores extravagantes, fontes das mais inusitadas, todas desejando chamar mais a atenção do que as outras para a sua marca.
Eu costumava usar essas caixas para guardar coisas no meu armário. Em uma guardava cartas, em outras guardava brinquedinhos, em outra guardava minha barbie com suas roupinhas. De repente me veio na cabeça uma linda imagem: e se todas aquelas caixas guardadas no meu armário fossem brancas? E fui além; imaginei o armário repleto apenas de caixas brancas, uma em cima da outra, todas do mesmo tamanho, se encaixando com perfeição. O que teria dentro delas era outra história, pois, afinal, quem observasse de fora não veria a imensa variedade de objetos que escondiam, as diversas cores, formatos, tamanhos, a forma caótica com que esses itens se ajeitavam; veria apenas uma cena homogênea, uma periodicidade branca.
Quis compartilhar as minhas ideias com minha prima:
"Às vezes você não acha que seria mais legal se todas as caixas fossem brancas, assim, desse tamanho?"
"Não" — ela respondeu.
A reposta espontânea e sincera de minha prima me surpreendeu. Então era só eu que pensava aquelas coisas. Comecei a me achar estranha. Realmente, porque alguém iria querer que todas as caixas fossem brancas se, afinal, poderiam existir tantas caixas bonitinhas por aí. Além do mais, por que ficar admirando uma caixa se o principal é o que vinha dentro dela? Será que era possível alguém admirar uma caixa branca, como eu? Minha prima provavelmente a ignorava, talvez, principalmente por ser branca e não trazer nenhum diferencial. Pouco tempo depois de ter voltado à sua cidade e ter colocado sua boneca na prateleira, deve ter jogado a caixa fora, sem dó.
Mesmo percebendo que ela não ligava para a caixa, não tive coragem de pedir. Afinal, uma caixa daquela não era suficiente; eu desejava muitas delas.
Ao perceber tudo isso, pensei que poderia ser como essas pessoas que eu imaginava não ligarem para caixas, nem para o fato de serem brancas, coloridas, escritas ou não. Mas eu já não era.
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