Ricardo tinha que encontrá-la. Ela tinha dado um sinal de que tudo poderia voltar, de que tudo poderia ser como antes. Ela não saía de sua mente e enquanto não a visse, não ficaria em paz. Resolveu fazer uma surpresa: iria esperá-la na saída da aula. Era uma tarde quente e abafada quando ele saiu de casa. Pegou um metrô e dois ônibus lotados e conseguiu chegar antes de a aula acabar. O céu escurecia e as nuvens ficavam carregadas. Começou a relampejar, a trovoar e uma forte chuva despencou de repente. Ensopado tentou abrigar-se debaixo de uma cobertura. O barulho da chuva era tanto que mal dava para ouvir o barulho da sirene que avisava o término da aula. Os alunos começaram a sair, um tumulto de carros, pessoas, guarda-chuvas formou-se em frente ao portão. Alguns saiam correndo com as pastas sobre as cabeças, com a tentativa de molhar-se menos. Os sapatos e as barras das calças ensopavam-se nas poças e enxurradas. Eis que o rosto dela surge no meio da confusão. Ela vai se desvencilhando tranqüilamente do amontoado de pessoas. Uma mão apoiada em seu ombro. Então Ricardo viu que ela não estava só. Um rapaz a acompanhava. Tentou se esconder, não poderia ser visto naquele estado. Seria muito constrangedor. Porém, logo o casal se separou. O rapaz saiu correndo no meio da chuva e ela ficou, procurando-o aflita e inquieta. Até que ele apareceu novamente e ela entrou em seu carro, que partiu.
Em um dia qualquer de trabalho, um colega que sentava ao meu lado chegou de manhã com um livro velho nas mãos. Me mostrou e perguntou se eu queria, pois ele já tinha uma edição daquele título. Havia encontrado no térreo da empresa, em uma prateleira em que os funcionários costumavam deixar livros que não queriam mais. Era No caminho de Swann, de Proust. Aceitei, já que não tinha o livro, mas um pouco descrente de que leria logo, pois andava na correria. Ao abri-lo, tive uma surpresa. Na folha de rosto, estava escrito à caneta provavelmente o nome de sua primeira dona, Rita, acompanhado de uma data: 06/06/81. Exatamente o dia em que nasci. Até prefiro ler livros mais novos, mas, depois dessa coincidência, topei em começar a ler este exemplar de páginas amareladas, manchadas e cheirando a velho. Ainda não terminei a leitura. Fiz paradas e retomadas. Em alguns momentos de extensa descrição, cheguei a me perguntar se deveria mesmo seguir, mas o meu encanto com a fineza de pensamento e d...
Comentários
A chuva não molha.
Millor.
Mas o que fazer com o gosto amargo
na boca, uma pressão no peito e uma
névoa nos olhos?
Beijão