Pular para o conteúdo principal

origami

Um sapinho verde, um tsuru azul e um pássaro laranja. Os três pequenos origamis amontoados sobre a escrivaninha, do lado do aparelho de DVD. Arrumo-os com carinho e eles retornam ao seu lugar.

Lembro da época em que os adquiri, há uns 4 meses: no ônibus, em uma tarde, voltando para casa. A viagem duraria cerca de uma hora. Um moço sentado a minha frente, tinha um livro nas mãos. Reconheci: ORIGAMI. Minha mãe o comprou quando eu era pequena. Trazia vários papéizinhos quadrados, fininhos e coloridos, e eu tentava seguir as explicações do livro para fazer as dobraduras. Me diverti bastante e cheguei a fazer as dobraduras do início, que eram mais fáceis. Às vezes arriscava, sem muito sucesso, aquelas tão bonitas dos níveis mais avançados. Depois o livro foi para a prateleira.

O livro do moço parecia ser novo, além do mais que ele tinha ainda vários papéis coloridos. Começou então a fazer as dobraduras, e eu, atrás, observando. Reconheci os formatos. Ele não precisava consultar o livro, já havia memorizado. Minha faixa de visão era o vão entre os bancos. Mas eis que chegou uma menina e sentou-se ao lado dele, e para minha infelicidade, reclinou o banco, o que dificultou ainda mais a minha visão. Imaginei que se interessaria pelas dobraduras, porém, ela, indiferente, dormiu.

Diante da indiferença da menina, senti-me mais próxima do moço. Como se tivéssemos mais coisas em comum do que imaginássemos. Puxei assunto. Ele olhou para trás, pois provavelmente não havia reparado que eu o observava.

Conversamos, falei que tive o livro quando era pequena. Ele o havia comprado no domingo na Liberdade, o dia anterior. Ele me contou dos formatos diferentes que conhecia. De um pingüim, de um alien, se não me engano. Ou seria um ET ou um robocop? Não me lembro. Mas sei que fiquei curiosa. Ele me disse que eram dobraduras muito complexas. Foi aí que ele me ofereceu a dobradura que havia acabado de fazer. Aceitei. Aí ele me deu outra. Perguntei se não faria falta,e ele me disse que já tinha várias na mochila. E aí me deu mais uma. Fiquei feliz. Um pouco de cor para mim, que estava com o coração despedaçado havia mais ou menos uma semana.

O moço não deve imaginar como as dobraduras foram importantes para mim. Até hoje, quando estou triste, se lembro de olhar para elas, sinto um reconforto.

Na Teodoro ele desceu. Usava uma bolsa à tiracolo. Lá na frente do ônibus, olhou para trás. Eu percebi. Nos outros dias não mais o vi. Quem sabe na outra segunda, no mesmo horário? Também não. E na outra segunda? Nada. Depois esqueci. Mas às vezes relembro, quando, de repente, noto que o sapinho verde, o tsuru azul e o pássaro laranja, mesmo mais amaçados e empoeirados, ainda estão aqui.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Crenças

Em um dia qualquer de trabalho, um colega que sentava ao meu lado chegou de manhã com um livro velho nas mãos. Me mostrou e perguntou se eu queria, pois ele já tinha uma edição daquele título. Havia encontrado no térreo da empresa, em uma prateleira em que os funcionários costumavam deixar livros que não queriam mais. Era No caminho de Swann, de Proust. Aceitei, já que não tinha o livro, mas um pouco descrente de que leria logo, pois andava na correria. Ao abri-lo, tive uma surpresa. Na folha de rosto, estava escrito à caneta provavelmente o nome de sua primeira dona, Rita, acompanhado de uma data: 06/06/81. Exatamente o dia em que nasci. Até prefiro ler livros mais novos, mas, depois dessa coincidência, topei em começar a ler este exemplar de páginas amareladas, manchadas e cheirando a velho. Ainda não terminei a leitura. Fiz paradas e retomadas. Em alguns momentos de extensa descrição, cheguei a me perguntar se deveria mesmo seguir, mas o meu encanto com a fineza de pensamento e d...

ao senso comum

Enquanto o ônibus estava parado no semáforo vermelho, o motorista aproveitou para sair do ônibus rapidamente. Voltou com um copo de café para o cobrador. Lembrei que uma amiga minha já havia contado: eles tinham o costume de descer naquele ponto para buscar água no posto de gasolina. O cobrador perguntou: "Está bom?". E o motorista respondeu, sorrindo: "Não sei, não experimentei antes para saber!". Bem humorado voltou ao volante e o cobrador começou a tomar o seu café, em um copo descartável. "Mas está bom", continuou o cobrador com o diálogo. "É, está melhor que antes", completou. O motorista voltou-se para trás, entendendo. "É, antes eram eles que faziam. Agora são umas mulheres que estão fazendo". "É, está bem melhor", disse o cobrador. Olhei pela janela e observei o posto de gasolina: duas ou três mulheres frentistas. Nenhum homem no local. "Será que foram todos substituídos por mulheres?", pensei. E o motorista...

alemão

O dia em que o encontrei considerei um dia de sorte. Estava cansada dos pedreiros enrolados e picaretas que costumavam prestar serviço no meu prédio. Mas, mesmo com poucas esperanças, fui perguntar ao porteiro se ele conhecia alguém que poderia pregar umas prateleiras e um varal, além de fazer outros servicinhos pendentes no meu apartamento. Foi quando ele apareceu. E logo o porteiro falou: "Acho que o Alemão pode". E voltando-se para ele: "Não pode, Alemão?" Alemão era diferente dos outros. Forte, largo, galego, parecia ter 1,70 de altura x 1,70 de largura. Careca, fazia-me lembrar do tio Fester da família Addams, porém, tinha uma generosidade em seu falar. Combinamos um dia para ele apaecer em casa. No dia marcado, Alemão atrasou. Os porteiros me informaram em qual apartamento ele fazia a reforma. Fui até lá. Com um moço, seu ajudante, ele trocava o piso de um apartamento vazio. Fazia o trabalho descalço, acentando aqueles grandes pisos de cerâmica no chão. S...