Em seu carrinho confortável, escuro, estava protegido de quase toda a agitação do metrô. Assistia a tudo, como se estivesse em uma redoma, àquelas pessoas grandes, sentadas ou em pé com a aparência cansada, apática. Mas desprezava os sentimentos alheios, apenas olhava. Na verdade, estava mais entretido com seus pezinhos, os quais ele insistia em manter para o alto, apoiados na mesinha de refeições do carrinho. O fato de ser muitas vezes menor do que os outros ao redor não o intimidava. Estava seguro e tranqüilo na sua posição de bebê, curtindo sossegadamente o seu nada a fazer, assessorado por seus pais, sempre ao seu dispor. Mirei em um de seus olhinhos, brilhantes. Quis chamar a sua atenção, como fazemos geralmente com os bebês. Acho que me olhou durante algum tempo, mas sem nenhuma surpresa, sem nenhum sorriso. Com suas calças verde-água de algodão macio e um paninho fresquinho e branquinho deixado suavemente em cima de sua barriga, era como se estivesse há uns 30 anos no mundo. Caramba! Que nenê seguro de si. Porém, se estivesse aqui há uns 30 anos, tenho minhas dúvidas se seria assim tão seguro de si.
Em um dia qualquer de trabalho, um colega que sentava ao meu lado chegou de manhã com um livro velho nas mãos. Me mostrou e perguntou se eu queria, pois ele já tinha uma edição daquele título. Havia encontrado no térreo da empresa, em uma prateleira em que os funcionários costumavam deixar livros que não queriam mais. Era No caminho de Swann, de Proust. Aceitei, já que não tinha o livro, mas um pouco descrente de que leria logo, pois andava na correria. Ao abri-lo, tive uma surpresa. Na folha de rosto, estava escrito à caneta provavelmente o nome de sua primeira dona, Rita, acompanhado de uma data: 06/06/81. Exatamente o dia em que nasci. Até prefiro ler livros mais novos, mas, depois dessa coincidência, topei em começar a ler este exemplar de páginas amareladas, manchadas e cheirando a velho. Ainda não terminei a leitura. Fiz paradas e retomadas. Em alguns momentos de extensa descrição, cheguei a me perguntar se deveria mesmo seguir, mas o meu encanto com a fineza de pensamento e d...
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